CAPETA DA CABECEIRA DO AREADO, O

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Nos idos tempos viveu um rico fazendeiro nas bandas da Cabeceira do Areado, Distrito de Chumbo. Duas características moldavam sua personalidade: ostentação e religiosidade. Frequentador assíduo da Igreja de Nossa Senhora das Dores, na Sede do Distrito, sua fala mais famosa era Quem tem Deus e Nossa Senhora das Dores no coração não acredita em capeta, repetida inúmeras vezes todos os dias e em qualquer lugar. Um dia, ouviu um comentário a respeito do curral de sua fazenda:

– Com tanto dinheiro e um curral fuleiro daquele!

E o homem não perdeu tempo e construiu o maior e mais bonito curral da região. Como vivia recebendo visitas, estas se espantavam com a beleza da obra. E ele sempre dizendo:

– Quem tem Deus e Nossa Senhora das Dores no coração não acredita em capeta.

Um dia sua mãe, já nos seus 96 anos de idade, lhe disse:

– Meu filho, saiba que o capeta existe sim. O verdadeiro cristão só está livre dele com fé em Deus, muita fé em Deus. Você vive dizendo para todo mundo que quem tem Deus e Nossa Senhora das Dores no coração não acredita em capeta. Pois pode acreditar, e você ainda está livre dele por causa de sua fé. Meu filho, essa fé é mesmo verdadeira? Porque, se não for, cuidado.

O filho, com um sorriso sarcástico, respondeu:

– Mãe, a senhora sabe muito bem o quanto prezo Deus e Nossa Senhora das Dores. E é por isso mesmo que não acredito em capeta, que a senhora insiste em dizer que existe. Ora, mãe, se ele existe, porque ele não vem aqui e destrói o belo curral que construí?

A mãe acariciou o filho com os olhos úmidos e se afastou. Poucas semanas depois, noite esplendorosa de Lua cheia, lá estava o fazendeiro apreciando a sua bela obra, para ele o curral mais belo da região, quiçá do Brasil, pensando com seus botões:

– Construí com meu esforço, com as graças de Deus e Nossa Senhora das Dores e a mamãe dizendo que o capeta existe. Isso aqui nem o maior furacão do mundo consegue derrubar e a mamãe dizendo que o capeta existe. Ora, se ele então existe, que venha e derrube esse curral de alguém que tem Deus e Nossa Senhora das Dores no coração. Quero ver!

Mal terminou de pronunciar as palavras, uma forte rajada de vento acompanhada de raios e trovões estrondosos abateu-se somente sobre o curral. Estupefato, o fazendeiro ouviu uma voz assustadora:

– Ora seu homenzinho desprezível, quer dizer então que acredita que o capeta não existe só pelo fato de ter Deus e Nossa Senhora das Dores no coração? Você é muito petulante. Pois estou aqui, seu convencido, eu, o capeta em forma de tragédia que é essa que você vai presenciar agora.

Imediatamente formou-se um enorme redemoinho que consumiu todo o curral, não sobrando nem um prego. E a voz deu fim à conversa:

– Você, ser inferior, vem há muito tempo zombando de mim, dizendo a todo mundo que não existo. É melhor você rever seus conceitos, Sr. Fazendeiro.

Num passe de mágica a noite tornou-se novamente esplendorosa com a Lua cheia. Cabisbaixo, o fazendeiro se retirou e nunca mais foi visto na região. Atualmente, toda vez que ventos fortes, raios e trovões se abatem sobre a Cabeceira do Areado, o povo mais antigo do local se lembra do trágico final do homem que não acreditava no capeta e os fazendeiros descendentes daqueles idos correm para verificar os seus currais.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann, coletado no distrito de Chumbo.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto de rfitaperuna.com.br.

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